quinta-feira, maio 31

Água territorial

Vivíamos numa época em que a nossa visibilidade na Europa era semelhante à projecção mediática dos 400 habitantes da Ilha do Corvo. Tínhamos a identidade açambarcada pelos espanhóis e até o Mário Soares teve dificuldades em assinar o tratado de adesão à CEE, porque o Felipe Gonzalez insistiu em rubricar os dois espaços em branco. Lena d'Água foi a propulsora do princípio do fim dessa agonizante indiferença. Nas tardes da RTP 2, logo a seguir às Misteriosas Cidades do Ouro, passava um género de MTV dos pobres, apresentado por um holandês que era doido pela nossa cantora pop. Não me recorda o nome do mestre de cerimónias, mas o programa chamava-se Music Box. Foi lá que nasceu o mega êxito Touch Me, da Samantha "Page 3 Boobs" Fox e também era lá que passava, pelo menos uma vez por semana, o clip Dou-te um Doce em Troca de um Beijo Salgado, com a participação especial do irmão goleador-benfiquista Rui. Tinha uma afeição especial pela Lena, derivados de a encontrar amiúde a adquirir víveres no extinto Pão de Açucar da Venda-Nova, às Portas de Benfica, mas o dito holandês cilindrava-me no afecto. Chegou a apresentar o programa desde Portugal, durante uma semana inteirinha. Óbvio que um dos dias foi dedicado em exclusivo à Lena, entrevistada no único espaço sumptuoso da altura, o hall de entrada do Hotel Le Meridien. É das ideias mais remotas que tenho dos conceitos pátria, ego insuflado e pele de galinha... e já agora, bigamia. Amava a Lena por amor a Portugal. Está de volta a sereia. Sempre, no Hot Club

terça-feira, maio 29

Marchas populares

- Então Flori, vais à Califórnia?
- Sim, sim... fiz uma hipoteca sobre a hipoteca da casa, adiantaram-me o subsídio de férias e consegui um crédito por telefone
- Não vais ficar lisa?
- Até à medula, mas uma pessoa tem de gozar a vida...
- That's the spirit! Olha, já agora fazes-me um favor?
- Claro, diz lá!
- Traz-me uma fotografia de mulheres extraordinariamente lindas dos estúdios de Hollywood
- Está descansado... podes contar com isso
...
Ontem recebi um postalinho com quatro senhoras liofilizadas em banho de prata, pregadas ao chão e com um mono na cabeça, simulando um desfile pela avenida em noite de Santo António

segunda-feira, maio 28

Burger Kid

As porcarias que se comem só pela causa do coleccionismo. Mas o Venom é uma delícia. Carrega-se no botãozinho do dorso e ele mexe as mãozinhas e abre as dentolas. É giro, mas não compensa a provocação de ser questionado pelo funcionário da cadeia de hamburguéres se ia desejar o Danoninho para a sobremesa

sexta-feira, maio 25

Florzinhas

A companhia gráfica subsidiada pelo Governo para elaborar o cunho português na presidência da União Europeia escolheu uma flor esborratada de um azul mesclado com um ténue cyan. Diz o Executivo que a Flor Azul, assim se chama o selo de referência, é simbolo da imagem de modernidade que Portugal granjeou no contexto europeu. Só me apraz dizer que, antes o sarro da micose de uma virilha transpirada que pétalas sedosas a desdenhar da nossa testosterona. Antes o pin da gloriosa águia Vitória que esta rabichice na lapela

quinta-feira, maio 24

O amor é lindo

Diálogo SMS
- Então, corre bem a vidinha?
- Si
- Temos de falar para combinar aquilo
- Tá
- É que daqui a nada chega o dia e ficamos apeados
- Pois
- Há azareco?
- Tou a namorar!!!
Ups (ou sejá lá o que isso quer dizer)

quarta-feira, maio 23

Rabo escondido com refego de fora

As minhas desculpas à incauta... mas estava a pedi-las

terça-feira, maio 22

Faz hoje um ano...

... que este blog nasceu, com um post muito choramingas. Parabéns para mim e, já agora, para o honroso terceiro lugar que conquistámos. Sempre fizemos melhor que (por esta ordem) Sporting de Braga, Belenenses, Paços de Ferreira, União de Leiria, Nacional, Estrela da Amadora, Boavista, Marítimo, Naval, Académica, Vitória de Setúbal, Beira-Mar e Desportivo das Aves. Festejar o quê??

segunda-feira, maio 21

Família feliz

Ultrapassado o terror da obstipação, a minha pequena filha atravessa uma rendosa fase de trabalhos purgativos. Rotinadamente, alivia-se duas ou três vezes no bacio, mas a corrida mais produtiva é indiscutivelmente a que nos levanta da mesa aquando do jantar. Numa dessas incursões, concluí que a Cice anda a refinar alguns conceitos sociais, como, por exemplo, os da família. Despachada da necessidade premente, e depois de esfregar o traseiro à higiénica Dodot, a minha filha apontou para as três postadas no recipiente e, indicou, hierarquicamente, para o papá, a mamã e o bebé. Não é para me gabar, mas o patriarca era o mais robusto dos três presentes

sexta-feira, maio 18

Números redondos

O Festival de Cannes celebra o 60º aniversário. Muitos parabéns!

quinta-feira, maio 17

Roda o pau

Estranharão vocês a obscura associação entre as três personagens acima reproduzidas em formato digital. Humberto Coelho, o homem comandado por 22 bravos guerreiros no Europeu de futebol de 2000, Vítor Espadinha, o Joe Dassin português, e António Tavares-Telles, o mais isento dos cronistas azuis-e-brancos, foram comparsas numa rubrica do saudoso Roda o Palco. Nas tardes de Verão de finais de 80, Espadinha dava cartas. Dizem que fora responsável pela irradiação compulsiva do bigodudo Luís Pereira da Sousa da televisão estatal e agarrou a cunha com um recreativo programa de variedades, rodado - literalmente - num cenário rotativo, que ia aviando convidados. Em semanas alternadas, Coelho e Tavares-Telles, que encobriam a identidade com o traje fúnebre de Salieri, avaliavam aleatoriamente espaços de restauração, atestando-os entre o Prato de Ouro e a Colher de Pau. A sentença dos comensais era proferida na presença dos proprietários do espaço em apreciação, proporcionando momentos de desmesurada tensão entre a larga fatia de telespectadores. Certo dia, o patrão de um estabelecimento, alvo de considerações pouco abonatórias, recebeu com manifesta azia a malfadada colher, para, de seguida, tentar aviar umas traulitadas no exigente crítico de comes e bebes. O palco rodou e nunca se soube se o Tavares-Telles se safou

quarta-feira, maio 16

Libertem o José!


E já agora, descubram o cachorro

terça-feira, maio 15

Cocó-cola

- Nós: Já fizeste?
- Ela: Num cunxigo
- Nós: Faz força
- Ela: Num xai
Um dia depois
- Nós: Já fizeste?
- Ela: Dá a mão
- Nós: Já fizeste?
- Ela: Num cunxigo
Dois dias depois
- Nós: Já fizeste?
- Ela: Só xixi
Ao terceiro dia
- Ela: Ploc, ploc (Duas enormíssimas pôias)
- Nós: Eeeeehh, finalmente!!
- Ela: Ponto, agora já poxo
- Nós: Já podes o quê??
- Ela: Coca-cola

segunda-feira, maio 14

Um Musk

Nos meus tempos de faculdade descobri um bálsamo de vaqueiro que acicatava as feromonas femininas. Farto da água de colónia Diabolique, passei a besuntar-me com aquele preparado laranja. Não havia dia em que narina de parceira universitária mais incauta não estremecesse com o aroma que brotava da minha jovial derme. Quando secava o frasquinho, regressava à drogaria para reabastecer do produto. Lá estava ele, a reluzir na terceira prateleira do estabelecimento, paredes-meias com os vasilhames de soda-cáustica, para desentupimento das canalizações. O Jovan Musk Oil entranhava-se à alma e à indumentária. Não existia detergente, pelo menos naqueles tempos, que diluísse as nódoas amareladas impregnadas nas camisas, que iam tombando para o caixote do lixo junto com as equimoses hepáticas que parasitavam o tecido. Há uns tempos, reencontrei o meu antigo aliado, que julgava extinto, numa bem mais asseptica montra da secção de higiene pessoal do Continente. Cedi ao revivalismo e adquiri a preciosidade. Bastou um par de dias para perceber que as expectativas olfativas também se vão moldando com os tempos. Para não dizer definhando com tanta porcaria sintética que por aí anda. Passaram a olhar-me de soslaio. Evitavam partilhar o mesmo elevador. Inclusivamente, trilhar as mesmas passadas. Uma amiga chegou a dizer-me, em visivel agonia, que já não se podia com o fedor a sardinhas. A minha Maria, também já nauseada com o insistente arraial de santos populares lá por casa, acabou com a brincadeira e ofereceu-me um suspeito CKin2U, a primeira mistela não-unisexo que o Calvin se dignou a arquitectar. Diz ele que a indústria dos aromas acaba de ser brindada com o primeiro perfume para technosexuais. Gente com mais de 20 anos (confere) e filiada na Beat Generation (desconfio que já não confere). Particularidades menores à parte, já não cheiro a sardinhadas. O meu corpo liberta agora finas baforadas de uma fragrância limonada, junto com extractos, passo a citar, de ethylhexyl, methoxycinnamate, linalool, butylphenyl, methylpropional, bemzophenone-3, ethylhexyl, saucylate, citronellol, butyl, methoxydibenzoylmethane, propylene glycol, alpha-isomethylionone, coumarin, citral, benzoate, jojoba hidrolizada, entre outras mezinhas. Temo é que já não tenho muita paciência para me amantizar com a impressora do segundo piso

sexta-feira, maio 11

Via santa

Os excursionistas da Cova da Iria já podem palmilhar o alcatrão sem o risco de envessar caminho. Uma empresa teve o cuidado de imprimir uns roteiros pormenorizados para os fiéis, que podem escolher onde pausar da maratona. Publicitam-se restaurantes, residenciais e até passeios a cavalo para folgar as solas. Para os que se contentam com uma bucha... ou uma mais atlética, são também disponibilizados serviços eróticos

quinta-feira, maio 10

quarta-feira, maio 9

A minha outra Maria

Sou orgulhosamente do tempo do Jornal do Incrível, exposto discretamente nas traseiras dos quiosques, junto das fotonovelas Gina e Tânia, ou do jornal Êxito, que oferecia alternadamente manchetes da Sabrina Salerno e Samantha Fox, eternas rivais mamárias e frequentemente emparedadas nas oficinas de mecânica. Cansado de tanta nudez gratuita, preferia devorar da versão popular dos Contos do Imprevisto. A Victoria Principal, a Panela Ewing do Dallas, era notícia recorrente, pelos alegados hábitos médium e frequentes tertúlias com marcianos. Soube também de um homem que sobreviveu uma semana no estômago de um tigre e que voltou a ser bafejado pela luz do dia depois de enfiarem um bidon de óleo de rícino na goela do felino. Ou que o Sandokan era uma mulher com pêlos púbicos no queixo. Mas o que retenho com mais saudade são as histórias de um punhado de felizardos que viveram noites de amor com imagens de santas. Estatuetas que ganhavam vida para oferecerem o prazer da carne a aldeões de lugarejos impronunciáveis das Filipinas. Mas julgo que a líbido das virgens só corporizava para essas zonas tropicais mais reconditas. A Nossa Senhora de bolso, de um majestoso verde-mámore fluorescente e que adquiri numa excursão escolar a Fátima, nunca deu sinal de vida. Só chegou para me desenrascar uns Suficientes num ou dois anos lectivos. Mas sempre aprendi a rezar...

terça-feira, maio 8

A folga

Com a vossa licença, hoje é dia de folgar os neurónios. Vou arrota-los alarvemente em 50 cl de xarope gaseado de coca. Untá-los em mel mascavado de pipocas humedecidas. Deixá-los enlear na seda viscosa do aranhiço. Depois de mais de uma semana a snifar pó de tijolo, mereço esta leviandade. Está bem que na Cinemateca passa o ciclo de Rainer W. Fassbinder, mas... não me apetece

segunda-feira, maio 7

Love toast

Há uns anos, o laranja Macário, adepto do cicloturismo, lambia cinzeiros depois de largado pela companheira nicotinodependente. Ouvi agora uma história com laivos de semelhanças. Uma pessoa de coração acalorado deixa queimar as torradas, aquando do preparo do pequeno-almoço, sob o pretexto de aquele filete de carvão proporcionar ao paladar o mesmo gosto dos beijos trocados com mais-que-tudo, fumador inveterado. É uma desculpa esfarrapada, mas sempre embeleza o descuido

sexta-feira, maio 4

Tet-point

No Estoril Open, joga-se ténis, mas há quem bata umas bolas
Imagem só possível pela minúncia objectiva do meu amigo Caracolinhos Sardinha

quinta-feira, maio 3

Cães laboradores

Há tarefas complicadas, como aquelas que aqui reproduzimos. Perde-se sensibilidade, ganham-se tendinites e arriscam-se mesmo luxações dos metatarsos. It's a fucking hard job, but someone have to do it

quarta-feira, maio 2

Desassossego do refego

Gostava de entender as virtudes do arejamento comum a ladrilhadores e mulheres, na sua generalidade e sem descriminação de silhuetas. Aos primeiros desculpa-se a deselegância pelo ofício. Têm de passar o dia de cócoras a untar as juntas dos parquets. Se nos quisermos inteirar do empenho do operário, para superintender os avultados honorários desembolsados, lá nos arriscamos a levar com a imagem do cotão enleado nos pêlos púbicos do cóccix. Agora as mulheres, à parte de um ou dois posicionamentos de amor, não têm justificação para a despudorada exibição do refego. Um desinteressado périplo pela cafetaria deste espaço de trabalho mergulha-nos na intimidade feminina. A cueca azul de algodão, com as costuras rendilhadas, da dama que se debruça, descuidada, sobre a chávena de café, depois de dois pingos lhe escorrerem pelas beiças. A asa delta branco-pérola da trombuda da contabilidade que cochicha ao ouvido da colega sentada do outro lado da mesa. Ou ou fio dental bordeaux da colega que se agacha sobre o tampo da mesa para beijocar a ex-grávida entretanto de regresso ao serviço. Enfim, rabos mal arrumados em jeans relaxadas, para todos os gostos, e desgostos. Da mais sedosa pele de pêssego à rugosa casca de laranja. É muita fruta!