sexta-feira, setembro 29

Orgulho a preceito

Não, não se trata de indumentária para desfile do arco-íris. A camisa reporta-se a um bando de artistas da bola, que envergam orgulhosamente o traje às pintinhas cardíacas. Um país aclamado pelo liberalismo sexual e narcótico idolatra uma equipa de inspirações estéticas e cromáticas de gosto duvidoso. Os ditos holandeses acabam de aviar uma frota de pescadores sadinos, surpreendidos pela articulada desenvoltura dos expeditos atletas. Diz a história da agremiação que os musculados troncos transpiram o tecido que reproduz canais de água cristalina e revigorante, que correm sob uma explosão de amor. Para quem reduz o futebol ao conceito de pura e dura masculinidade, eis uma bofetada de luva branca de um grupo de pessoas diferentes e descomplexadas. O desporto rei também é para rainhas

quinta-feira, setembro 28

Gimmy 5!

A Kathy é um boeing que se encantou pela minha graça. Tentou-se pelo meu perfil público e vasculhou a minha intimidade. A formosa rapariga, de roliços implantes mamários, descobriu-me e pousou dengosa no meu recanto. Como bem prova o registo, é visita frequente ao meu espaço. Não deve ter gostado nada de saber que sou um fiel, cumpridor e zeloso pai de família. A Kathy tem azar. Não será todos os dias que a loura platinada rasga o sorriso por um brinde masculino da minha estirpe. Mas enfim... infortunada existência, terá de indagar por outro ancoradouro que lhe ampare os impulsos da líbido. Minha amiga, instintos reprodutores é noutra secção, que eu continuo a ponderar seriamente na vasectomia. São umas pestes as crianças

quarta-feira, setembro 27

Pig style

Os tormentos do amor podem resultar em consequências nefastas. Amar é trágico. Deforma-nos. Transforma-nos em trapos pindéricos. Amassa-nos em bedum irreciclável e fétido. O Cocas saturou-se das possessivas cabeladas e intercedeu junto do manipulador Jim Henson para correr com a desequilibrada. Exonerada compulsivamente dos marretas, tentou a sorte no terceiro calhau a contar do sol e continuou a achincalhar os terrestres. Seguiu-se uma fornada de papéis secundários até que Miss Kristen, rebaptismo da ex-leitoa, se cansou. Em pleno sexo e a cidade, lançou-se de uma penthouse e enlutou a família Flinstone
...
Que raio. Está um gajo sossegadinho a zappear a TV até que se depara com a maluca da Sally, com mais 20 quilos e a snifar coca. Teve passagem fugaz na série das frustradas. Dois minutos volvidos, atiraram-na pela janela

terça-feira, setembro 26

Crómio Adesvaldo

Tenho honra e vaidade de me ter sido permitido partilhar um registo histórico de incomensurável valor. Um magnífico espaço revivalista de coleccionismo varoníl ofereceu-me de bandeja a fronha que me arrebatou horas de pesquisa em motores de busca. Derrotado pelo insucesso, arrumei a viola no saco. Alvíssaras à luz renascida, que me alumiou o conformismo. Lima, que já teve honras de referência neste lugar, foi um dos ícones do monstro adormecido. Retenho uma manifesta incapacidade de sprint, fruto das camadas adiposas ali na zona dos glúteos. Calejou as nutridas nádegas no banco de reservistas, mas proporcionou sonoras gargalhadas pelos três aneis acima. A densa melena anexa ao cocuruto reforçava-lhe a estampa anedótica. Adesvaldo José açambarcou a réstia de seriedade de uma actividade desportiva que já caminhava para o descrédito. Depois deste pezudo, foram aterrando na Luz aviões de incapazes. Depois do Lima, lembro-me de rir alarvemente com o Valdir do Bigode. Aguardo inquieto que este meu amigo o descubra para gracejarmos todos juntos

domingo, setembro 24

Solidarnosc


Eu também sou solidário

sábado, setembro 23

Dói-dói

Fim de viagem. Preparo-me para desligar o rádio, que corria determinada música lamechas. De imediato, ordem imperativa do banco de trás: Nã 'pága!!! Eh lá... amantizou-se pelo sonzinho amaricado. Deixei-me ficar para lhe lhe satisfazer o capricho. Inclinou-se na cabeceira do lugar do morto e informou-me pesarosamente: Tichte, a Béia tá tichte. Quem? A Béia... tiiichte. Temi pela constatação que vinha já a seguir. Referia-se à floreada. Logo a seguir, escangalhou-se-me o coração. De olhinhos marejados, partilhava a dor de um amor impossível. Abraçada à cabeceira do banco da frente, de queixo em esgares trémulos e lágrima furtiva, sofreu pela indiferença de Frederico. Apeteceu-me bater em retirada e chorar... de vergonha

AnAlfinetada de peito

Há poucos dias, a credibilidade do futebol mundial sofreu uma machadada quase letal desta senhora. Mesmo a convalescer das feridas, o pontapé na bola lavou a cara e aniquilou de novo o preconceito sexista, que ameaçava ressurgir do lodo. Milhares de milhões de incrédulos continuam a digerir a desengonçada ingerência das mulheres no feudo masculino da bola, ali para as bandas do Brasil. No outro lado do Atlântico, o cantinho português provou que o futebol é assexuado e capaz de reproduzir raros fenómenos. Ana Raquel Brochado... Boa, és boa... é a primeira mulher em Portugal a intrometer-se no futebol masculino e parece que ajuizou com competência... O teu lugar é a lavar pratos... o clássico entre o Bombarralense e o Monsanto, em Óbidos... Não podes com esse cagueiro. A exigente crítica da imprensa das Caldas da Rainha avaliou positivamente o desempenho desta jovem de 25 anos... Anda cá que eu puxava-te o lustro... que teve de inchar o peito... Grande par de tetinas... para admoestar disciplinarmente dois prevaricadores com o cartão vermelho. O nosso pequeno rectângulo deu novo exemplo de urbanidade... Vai mas é pró balneário agachar-te aos sabonetes

sexta-feira, setembro 22

Dias da rádio

Há vínculos de vida que me envelhecem assustadoramente. Foi nesta charamela de feixes hertzianos empoeirados que acompanhei as atribuladas desventuras de Patilhas e Ventoínha. A dupla de benfeitores que zelava descuidadamente pelo cumprimento das disposições legais. Era um fartote. Uma verdadeira pândega de risota com aquela dupla de trapalhões. O que eu me divertia com as piadas eucarísticas dos Parodiantes de Lisboa. Lembro-me de um dia a minha avó ordenar ditatorialmente que desligasse as turbinas do encorpado emissor. Preparava-se para acompanhar em directo as bodas de Carlos e Diana. O momento exigia silêncio solene e aquela porcaria debitava um valente ruído de fundo. E a frase. O que eu torcia para que o caro ouvinte se espalhasse ao comprido quando desafiado a repetir o chavão comercial do dia. Em reconhecimento da lealdade ao programa, premiava-se o caro ouvinte com a música pedida. Acho que foi de tocar tantas vezes no programa do Telefone que o Amanhã de Manhã se transformou no primeiro hit erótico pós 25 de Abril

quinta-feira, setembro 21

Bandeirada de banhada

Desculpem lá, mas cá vai disto: fosga-se para a Fnac e os seus delírios de grandeza. Rameira que os parturiu mais a brincadeira. Anda uma pessoa há anos à procura de um certo e determinado filme no actualizado registo DVD, por mero acaso uma obra-prima, e os responsáveis do dito estabelecimento só disponibilizam a cenoura se empacotada com a inútil vara do cordelinho na ponta. Para que quero eu adquirir o Comboio Mistério se apenas desespero pelo Noite na Terra? Não duvido que o Jim Jarmusch seja realizador de inesgotáveis credenciais, mas não seria mais sério comercializar as obras individualmente? Agora enfardá-las a vulso para os cinco ou seis indefectíveis do Jim em solo português?? Caros senhores proprietários da superfície comercial, eu não sou um gajo abastado. Tenho contas que me consomem o ordenado e canalizo os míseros trocos sobejantes para modestos consumos lúdicos. Isto com o intuíto de não ensandecer de vez e começar a alvejar os infelizes que populam o espaço laboral junto de mim. Só por isso, estão a dar-me vontades de olear os canos serrados para esfrangalhar os arrumos das vossas prateleiras. Crápulas!

quarta-feira, setembro 20

Hellas!

Tamanha fonte de inspiração esmaga-me. Atropela-me os sentidos. Faz de mim um mau profissional. Anestesia-me o brio. De um lado, a casa de banho escoltada por uma dúzia de yuppies. Do outro, o cenário grandioso de um gigante adormecido por incompetências e compadrios. Uma história dramática de vitórias fugazes. Um colosso que se ergue do chão, de aparência inacabada e cimento agreste, mas que arranha o céu com os arcos de triunfos vindouros. A afrodite Helénia clama pelo teu regresso. Corre, Fanã... corre

terça-feira, setembro 19

Catwalk

Mas que grande porra. Já não posso mijar descomprometidamente. Mudaram-nos para um open space e corromperam-nos o resguardo do quarto de banho. Na versão antiga, as necessidades prementes eram encobertas por um corredor. Agora, tenho de atravessar uma sala apinhada de gente selecta, que trata de oscilações da Bolsa e priva com os maiores banqueiros. É que desencoraja qualquer um. Imaginar o Paulo Teixeira Pinto do outro lado da linha a chorar o provável fiasco do Sol dá-me um nó na bexiga. Muita gente fina a olhar-me de soslaio, enquanto me apresso para arrear o calhau. É que nem uma flatulência para quebrar o gelo. Que desfile macabro. Ainda por cima, o autoclismo faz uma chinfrineira pior que um porco a ser castrado. Não volto a passar pela mesma vergonha. Estou aqui aflitinho e começo a enamorar-me pelo vaso das plantas

segunda-feira, setembro 18

Mortos-vivos

Fornadas de gente de volta a casa. Um mar de vivalmas fitando o pavimento. Carregadas de sangue de raiva. Inconformadas com a sorte que lhes calhava. Arrastavam-se pelos passeios, com destino ao jantar. Conforto irrisório para tamanha desgraça. Um estômago cheio não sacia um coração vazio, esfaqueado pela tormenta perene. Indignação que grassa, raiada a vermelho, sem Luz que se vislumbre em futuro risonho. O Benfica ganha, mas o estádio esvazia em carreirinhos fúnebres. E o Fanã resiste outra semana

domingo, setembro 17

Pezinhos de coentrada

Não vem nada a propósito, mas hoje apetece-me recordar um grande goleador. Pode parecer descabido, mas deu-me para evocar este artista da bola. Ágil com ambas as pernas, ludibriava os adversários com um viperino malabarismo de rins. Parece mesmo despropositado de momento, mas é de inteira justiça lembrar o felino angolano. Temível artilheiro, trocava os paços aos defesas contrários. Marcava com tudo o que lhe vinha à mão. Graças ao instinto artilheiro, concretizava golos para todos os gostos. Um deles teve mesmo honras de Marselhesa. Um tributo francês aos dotes do africano. Era um verdadeiro leão da área. Mas continua a intrigar-me porque raio fui eu agora lembrar-me do Vata Matanu Garcia

sábado, setembro 16

Os olhos da cara

Gosto dos meus óculos. Ajudam no impacto presencial. Fortalecem-me a personalidade. Têm áurea canídea e grudam-se-me como fiéis companheiros. Provavelmente marraria nos postes sem eles. Por serem úteis, prefiro também que sejam estéticos. São desportivos e projectam-me uma ficcionada imagem de atleta. São alvo de cobiça dos invejosos. O argumento das mulheres para me fitarem os olhos. Já me escorregaram nariz abaixo. Estatelaram-se no chão. Empastelaram-se na lama. Chegaram a andar escondidos nas cuecas de uma stripper. Folgaram-se-me nos parafusos. Entortaram-se no eixo. Enfim, uma série de contrariedades, que não os desencorajam, porém, a manter-me a íris sintonizada à nitidez possível de um mundo nubiloso. Os Oakley Blue Velvet pecam apenas pelo nome amaricado, mas são a minha cara

sexta-feira, setembro 15

Apito furado

Silvia Regina de Oliveira arrisca constituir-se na prova cabal de um suspeito preconceito. Diz-se que o futebol é um exclusivo masculino, mas esta árbitro quis denunciar a grosseira doutrina sectária. Começou a inflitrar-se nas peladinhas lá do bairro da Tijuca. De buço rabiscado com uma rolha chamuscada, disfarçou-se de garoto e experimentou alvejar as redes. A fraca pontaria e a técnica pouco apurada desencorajaram a aventureira. Fruto de um nobre instinto de justiça, tentou depois carreira numa das mais ingratas actividades desportivas. Graças a um fôlego de soprano, foi ganhando estatuto no apito e chegou mesmo a ser condecorada com as insígnias internacionais. Cumprindo literalmente os ensinos do direito penal, a justiça da Silvia cegou para concretizar o sonho de um jovem apanha-bolas. O moleque corrigiu a trajectória de um esférico pontapeado pela equipa da casa e introduziu a redondinha na baliza adversária. O revivalismo dos tempos da Tijuca emergiu das recordações empoeiradas e a implacável juíza validou em golo a brincadeira do rapaz. Apesar do incidente, eu acredito que o futebol também é para mulheres, como tão bem entendeu a Trifene, que veste de laranja as cheerleaders do Estádio da Luz

quinta-feira, setembro 14

Método de descarte

O senhor Edward Murphy era um incompetente assalariado da Força Aérea dos Estados Unidos. Certo dia, o engenheiro de serviço meteu baixa de paternidade e delegaram no pouco inteligente funcionário a tarefa de dirigir uma experiência revolucionária. O Departamento de Defesa dos States queria testar a resistência humana à velocidade de ponta. Reuniu um grupo de cobaias e requisitou o Murphy para colocar as ventosas nos pobres diabos. O problema é que o senhor era tão desajeitado que se enganou na distribuição dos 16 sensores. O teste ficou naturalmente inquinado e os volutários sofreram múltiplas fracturas expostas. Murphy sacudiu o capote e imputou no tarefeiro as responsabilidades da tragédia. No relatório do incidente, explicou descaradamente: se há duas ou mais formas de fazer alguma coisa e uma das formas resultar em catástrofe, então alguém a fará. Correram com o pobre contínuo e elevaram Edward Murphy à categoria de sábio legislador. O homem que justificou o azar como consequência da inabilidade de outrém. A desresponsabilização virou quase ciência do infortúnio e inspirou a justiça portuguesa

terça-feira, setembro 12

TransTatu

Lembro-me de há uns anos atrás um treinador responsabilizar os árbitros gatunos pelos maus resultados da equipa que orientava. Num desabafo irreflectido, praticamente inédito no futebol português, o mister lamuriou que, se tivesse um circo, até o anão tinha crescido. Exceptuando alguns fenómenos noticiados pelo insuspeito (já defunto) Jornal do Incrível, só me ocorre uma situação análoga à relatada pelo queixoso técnico de futebol. Tatu, fiel escudeiro de Mr. Roarke na Ilha da Fantasia, cansou-se das lições de vida aplicadas aos incautos visitantes do espaço insular e quis mudar de vida. Contratou um dos mais reputados clínicos do ciclismo internacional e submeteu-se a um criterioso programa de injestão de hormonas de crescimento. Anos depois, a bem sucedida metamorfose encanta nos festivos arraiais das mais recôndidas colectividades. Amiude, uma ou duas cantilenas no Portugal no Coração mediatiza a reiterada convicção que o sonho de um homem cresce à medida de mais dois palmos de testa

segunda-feira, setembro 11

Holy shit

Tenho a firme convicção que os supermercados expressam fielmente a cabala que Deus e os seus acólitos movem contra os infelizes mortais. Falo por mim, constante alvo dos instintos persecutórios do Criador. Lá com arranjinhos de bastidores, arranja-me sempre a fila mais lenta. Inclusive nas caixas expresso, destinadas aos que lá passaram para desenrascar uns guardanapos e meia dúzia de papo-secos. Ainda no outro dia abdiquei de uma caixa de cereais com brindes do Super Homem para não rebentar com a restrição exacta de 10 unidades. Ladeado por quilómetros de filas de carrinhos atolados, desfilei até ao insignificante carreirinho que encaminhava à caixa expresso. Choquei-me de pronto. Na minha dianteira, um par de impostores. Acomodavam no tapete da caixa números além do permitido. Contei-os criteriosamente. Um com 11 e outro com 12 bens de consumo. Não bastasse a vilanagem e o compadrio cúmplice da funcionária, o desequilibrado da minha frente perdeu uns bons 10 minutos a escolher três sacos da resma ao dispor. Sinceramente, não sei o que procurava, mas o zelo da selecção paralisou-me de revolta. Deus divertia-se, por certo, lá por cima com os cromos do Clark Kent, enquanto mordiscava, a seco, uns Chocapic. Que se engasgue

sexta-feira, setembro 8

Valsa de livro

Não tenho tempo para grandes leituras. Ler chateia-me porque há capitulos que nunca mais acabam. Lembro-me de há uns tempos ter cedido à onda do Código de Da Vinci e ter espreitado a prosa do Dan Brown. Confesso que me cansei à décima página e nunca mais lhe toquei. Mesmo assim, consigo reunir alguns livros que se imortalizaram na minha vivência pouco letrada. Lembro-me do primeiro de todos, Gente Marcada, do Manuel Arouca. Bem melhor que o famoso diário de Christiane F, os Filhos da Droga, que larguei a meio. Delirei com o Coca Cola Killer, do mestre-maestro António Vitorino de Ameida. Experimentei o Como Água para Chocolate e... pronto, admito que gostei. Aprecio aquela escrita fluída e utópica, num mundo de metáforas e fantasiado até ao tutano. Contrariando um pouco o cepticismo sobre blockbusters literários, adorei o Perfume e a concepção homicida dos aromas. Aprendi muito com o Pequeno Tratado das Perversões Morais, que confirma quase cientificamente o nosso potencial de reais bestas. Numa forma mais sociológica-cómica, estive Entre os Vândalos, o hilariante documento de um professor norte-americano infiltrado nas claques inglesas. Uma das minhas últimas grandíssimas descobertas deve-se a um jornalista que rabisca umas ficçõeszinhas nas (poucas) horas vagas. José Prata criou um inspector da Judiciária bipolar, que exorciza uma relação incestuosa com a mãe em prostitutas anafadas. Os Coxos Dançam Sozinhos, um policial de rir às lágrimas, indicado para quem se farta de andar perdido em hiper-capítulos de mega-histórias redundantes

quinta-feira, setembro 7

Tábua rasa

Alvíssaras à Jamila, que não ganha bicho
Madeira nobre, de barrotes seleccionados
Olhar pungente, que se aloja no nicho

Eriçando almas com os glóbulos cavados

De capilares ralos acomodados ao tino
Vomita as dores de um mundo banal
Engrandece o trolha, o servente e o continuo
Conspurcando intolerâncias de cariz social

Santa mulher que o povo anseia
Em cruzada ao desmesurado capitalismo
Imaculada a aurea que a rodeia
E a crença num ressuscitado socialismo

Gostei dela quando a vi mancar no parlamento, provavelmente depois de um imprevisto nas aulas de equitação. Pensei logo que seria dos raros deputados da nação com a frontalidade de recorrer a muletas

quarta-feira, setembro 6

Incrível Ke É Auntêntico

Uma ilegítima apropriação de imagem da cadeia sueca. Os legítimos desencadearão agora todos os recursos judiciais indemnizatórios, que reclamem, em numerário, a reposição dos direitos de propriedade e de copyright

terça-feira, setembro 5

Deu-lhe quase todo


Nota prévia: a identidade de todas as personagens foi devidamente salvaguardada num confortável anonimato
Ele: Olha o gajo... o gajo pá!
O outro: Quem? Quem?
Ele: Aquele pá... o cantor
O outro: Chiça... quem?Não estou a ver
Ele: O coxo pá... o Bozo, ou lá o que é
O outro: O palhaço??
Ele: Nããã... aquele que canta
O outro: Aaah... já sei. O que é que está aqui a fazer?
Ele: Está ali com uma miuda a beber umas Coronas
O outro: Olha agora... está a mostrar-lhe o rótulo
Ele: Xiiii, pois é... grande ordinarice... está a tapar as letras do meio
O outro: Ela não deve ser portuguesa... não está a perceber a graça
Ele: Está sim... o gajo está com a outra mão debaixo da mesa
...
Nota final: momento imortalizado graças ao olho clínico de um refugiado belga

segunda-feira, setembro 4

Toque de Midas

A industria dos cosméticos vende ilusões. Estanca-se a mocidade com pastas adiposas. Engoma-se a pele e fazem-se figas para que não volte a encarquilhar. As mulheres forjam o relógio do tempo. Recuam forçadamente nos passos do caminho destinado. Ousam substituir-se a quem de direito e desgovernam-se com o poder aparente. Shirley Eaton é um dramático exemplo de quem se enebriou com um pedaço de nada. Ambicionou encarnar Midas e dourou-se até às pontas espigadas. Entupiu a derme com uma mixórdia a simular discos premiados para se enrolar de pronto com o Sean Connery. Levou anos a desenvencilhar-se da cobertura. Findo o doloroso processo de decapagem, ficou o esgar estanque, com aspecto falacioso de sorriso. Um sério aviso a todas que intentem usurpar funções ao Divino

Eu também sou romântico

Ricky Gervais, provavelmente o verdadeiro artista
Deixem-se embalar pela melodia. A sedução pura na voz de uma ave rara

domingo, setembro 3

Consumir antes de se finar

Está desvendado o mistério. Amar para sempre é conceito ficcionado pela indústria cinematográfica. Com uma crueza arrepiante, a minha colega Marta Stewart explicou, na Revolta dos Pastéis de Nata, que o amor tem prazo de validade. Acabou-se a legitimidade das senhoras nas lamechas denúncias sobre justificadas escapadelas dos parceiros. Não é adultério, é instinto de sobrevivência. Sabe-se agora, pela voz da mais gira sexóloga portuguesa, que o amor é sentimento que se esgota. Numa pragmática leitura sobre as relações, Marta aniquilou as metáforas e fixou o mediatizado sentimento num prazo de 18 a 20 meses. Ou seja, em média, ama-se o suficiente para procriar. A paixão inflama-nos os apetites e o amor trata de humanizar os impulsos. Mais, só nas divagações utópicas dos romancistas. Nem Desmond Morris conseguiu ser tão barbaramente selvático no seu Macaco Nú. O veredicto da especialista confirmou que somos todos coelhos àvidos pela salvaguarda da espécie. Estamos confinados à condição de reprodutores. O amor é reciclável

Estamos fiuzados

Começamos a ter demasiadas afinidades com os belgas. Foi esse povo estranho que mediatizou a pedofilia e exibiu as aberrações de uma sociedade globalizada e decadente. Nesse caos de reprovação, o país dos cantões arquitectou uma estratégia higiénica para desviar atenções. Desencantou um jogador da bola mediano, mas bem parecido, e revolucionou o mercado futebolístico. Jean Marc Bosman fez jus ao segundo nome próprio e de semblante carente, tal qual Marco em busca da progenitora, choramingou por emprego junto das altas instâncias europeias. Sentidos, os comissários de Bruxelas deram provimento às súplicas do desempregado e forçaram a FIFA a liberalizar o mercado de transferências. Como as epidemias se propagam, também em Portugal alguns senhores graúdos foram apanhados, anos depois, a cobiçar carnes frescas. Juntou-se um punhado de bodes expiatórios e ainda hoje se espera que tipo de punições reserva a nossa desembaraçada justiça. Se na Bélgica foram lestos a repreender os desequilibrados, por cá julga-se a ritmo de banho Maria. Talvez para desviar frustrações, o nosso futebol também desencantou um mártir para a fogueira das alarvidades. O problema é que não é bem parecido e nem sequer bem falante. O nosso Bosman é carequinha e gosta de levar os assalariados a Lisboa visitar o Jardim Zoológico. António Fiúza até rapou o bigode derivado dos pedaços de sopa que se pegavam ao buço. Agora fica melhor na fotografia. Convém, pois será aquela carinha laroca que ficará imortalizada como a coveira do futebol português. Não se perde grande coisa, mas sempre me dava algum gozo ver o meu Benfica aviar equipas inglesas

sábado, setembro 2

Arrepios

Lisa Gerrard, provavelmente a melhor voz de sempre
É um bocado tétrico, mas de outra forma não teria piada. Não fosse a artista vocalista dos Dead Can Dance

O bom marciano

Há personalidades peculiares. Cromos difíceis. Gente estranha. Enganos genéticos. Atropelos de encarnação. O Manuel João Vieira é uma miscelânia concentrada disso tudo. Arrisco que este homem nunca terá proferido uma palavra a sério. Nunca terá gesticulado sem intuito provocatório. Espanta a cantar, mas não sei ainda se pelo mal dos outros ou por aflições próprias. Apesar de tudo, gosto do aparente porreirismo. Gabo-me mesmo de um encontro imediato, a mielas com um antigo parceiro de labuta. Saímos tarde do trabalho e decidimos socializar com copos e música a granel. Como era perto, escolhemos o Frágil, já numa altura em que heteros e homos confraternizavam em cavaqueiras descomprometidas. Mesmo assim, estava uma noite alucinada. A Mísia fazia-se escoltar por dois negões forrados a lycra rosa. O Paulo Bragança carregava uma cardina que até disfarçava aquela aparência de nem carne nem peixe. Nós divertíamo-nos no balcão com o ambiente psicadélico. De repente, abeira-se de nós um robusto vulto, com esgares de ameaça à porrada. Reconhecemos o artista e preparamo-nos para o pior. A fera, afinal, estava mansa e cobiçava o porta-chaves do meu amigo. Sacou o que queria, passou o resto da noite a iluminar-se com os infra-vermelhos do Ford e nunca mais nos ligou pevide

sexta-feira, setembro 1

Cristal pardo

Aqui exponho um dos antes-e-depois mais dolorosos para comparsas de geração. Descontando umas fotonovelas rascas resgatadas de um caixote das imediações da escola primária, a Sylvia Kristel foi a primeira mulher nua que os meus olhos avistaram. Foi estrela da redundante saga Emanuelle e ícone do chamado soft-porn, pomposamente aveludado com a chancela de cinema erótico. Monopolizava as objectivas com a tez alva e os seios de túlipa. Curiosamente guardo da sequela uma das cenas mais arrebatadoras da história do cinema. Penso que nas Filipinas, uma ágil contorcionista de cabaret ensinava os truques de inalar cigarros pelas partes baixas. Quanto à Sylvia, o pacote foi definhando e sobrou uma versão holandesa da Paula Rêgo. Dedica a reforma a escrevinhar numas telas, em delírios subsidiados por um grupo restrito de saudosistas abastados

Corta-te e cola

Há quem se agarre à convicção da existência do Pai Natal como o cinto de pesos do infeliz proprietário de um trimaran, lá para as costas algarvias. Eu também acreditei religiosamente no velhinho barbudo, mas forçaram-me a abdicar da crença ainda infante. Não foi fácil, acreditem. Deixei de ver as renas a abalar até outra chaminé e angustiei-me naquele Natal de transição. A figura que se seguiu no complexo processo fantasioso de petiz foi o Homem Aranha. Tal como a minha enlutada adoração a São Nicolau, também Peter Parker se fixava determinadamente às convições. Com essa musculada perseverança, tinha o dom de superar todas as barreiras. Microscópicas pelosidades aracnídeas permitiam ao nosso herói trepar pelas paredes. O conceito literal foi depois conspurcado por uma marca de colas. Com espírito crítico ainda tenro, também eu desejei espairecer pelos tectos, junto do cientista. Imaginava-me já de fatiota de Spiderman besuntada de Araldite. Já estava com ela fisgada. Faltava apenas convencer os meus pais a adquirir a fantasia do aranhiço. Ainda ponderava a melhor estratégia para a chantagem emocional, mas renunciei à última depois de salvo por uma fatalidade alheia. Um primo explicou-me detalhadamente como contornou um pequeno incidente com a rival Super Cola 3. Colou o indicador ao polegar e só demoveu os dedos do destino siamês à força de uma espátula. Devo ter vomitado as três últimas refeições, mais a bílis da quarta