Há quem se agarre à convicção da existência do Pai Natal como o cinto de pesos do infeliz proprietário de um trimaran, lá para as costas algarvias. Eu também acreditei religiosamente no velhinho barbudo, mas forçaram-me a abdicar da crença ainda infante. Não foi fácil, acreditem. Deixei de ver as renas a abalar até outra chaminé e angustiei-me naquele Natal de transição. A figura que se seguiu no complexo processo fantasioso de petiz foi o Homem Aranha. Tal como a minha enlutada adoração a São Nicolau, também Peter Parker se fixava determinadamente às convições. Com essa musculada perseverança, tinha o dom de superar todas as barreiras. Microscópicas pelosidades aracnídeas permitiam ao nosso herói trepar pelas paredes. O conceito literal foi depois conspurcado por uma marca de colas. Com espírito crítico ainda tenro, também eu desejei espairecer pelos tectos, junto do cientista. Imaginava-me já de fatiota de Spiderman besuntada de Araldite. Já estava com ela fisgada. Faltava apenas convencer os meus pais a adquirir a fantasia do aranhiço. Ainda ponderava a melhor estratégia para a chantagem emocional, mas renunciei à última depois de salvo por uma fatalidade alheia. Um primo explicou-me detalhadamente como contornou um pequeno incidente com a rival Super Cola 3. Colou o indicador ao polegar e só demoveu os dedos do destino siamês à força de uma espátula. Devo ter vomitado as três últimas refeições, mais a bílis da quarta
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3 comentários:
Bom meu amigo, tenho a dizer-te que deixaste de realizar uma fantasia à conta do "cagaço" do teu primo... Oh, como eu queria que tivesses sido mais destemido para agora ter um relato da tua excursão ao tecto do teu quarto à boleia da Araldite...
Sabes que mais, saber que o Pai-Natal era ilusão, deu-me para chorar baba e ranho durante um mês. Ainda hoje sinto o trauma...
Um beijo
psst... tenho fontes que me garantem ter visto um anafado de gorro na cabeça a aliviar-se numa árvore da Lapónia... tenhamos esperança. ele volta
Mas o meu pai Natal não se aliviava assim numa árvore. Se for para voltar e dar-me um desgosto desses, vale mais continuar morto para mim...
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